Na contramão de sua jurisprudência majoritária, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal por unanimidade, em acórdão proferido no processo 5002582-02.2016.4.04.7008/PR, de lavra do Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz, considerou legal a retenção de mercadorias importadas em razão da reclassificação fiscal, para recolhimento da multa e diferenças tributárias.
Na decisão, que deu provimento ao apelo da União e reformou a sentença que havia concedido a segurança para liberação das mercadorias, consignou-se que a Súmula nº 323 do Supremo Tribunal Federal não se aplica quando se trata do desembaraço aduaneiro de mercadorias.
Referida Súmula possui o seguinte enunciado: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos.”
A decisão fundamentou-se em precedente do STJ (REsp 1668909/SC), que tratava de desembaraço aduaneiro impedido por suposta prática de dumping, em razão de risco ao mercado nacional, situação muito distinta da exigência de multa e diferenças tributárias decorrentes da reclassificação fiscal.
Em casos idênticos, a maioria das decisões do TRF4 são diametralmente opostas:
TRIBUTÁRIO.MANDADO DE SEGURANÇA. DESPACHO ADUANEIRO. RECOLHIMENTO DE TRIBUTOS. RETENÇÃO DAS MERCADORIAS. Não se admite que a autoridade aduaneira condicione o desembaraço aduaneiro ao pagamento de tributos decorrentes da reclassificação fiscal das mercadorias. Precedente.
(TRF4 5004878-72.2017.4.04.7101, PRIMEIRA TURMA, Relator MARCELO DE NARDI, juntado aos autos em 18/07/2018).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESPACHO ADUANEIRO. PRAZOS. GREVE DOS SERVIDORES DA RECEITA FEDERAL. DIVERGÊNCIA NA CLASSIFICAÇÃO TARIFÁRIA. RETENÇÃO PELO FISCO. 1. Inexistindo prazo específico para o desembaraço aduaneiro, deve ser observado o prazo de oito dias, estabelecido para execução de atos no âmbito do processo administrativo fiscal pelo art. 4º do Decreto 70.235, de 1972. 2. O movimento grevista dos servidores da Receita Federal não pode inviabilizar a atividade produtiva das empresas que necessitam da prestação do serviço público que lhe é essencial e inadiável. 3. A Administração Fazendária não pode reter a mercadoria importada como forma de obrigar o importador a aceitar a reclassificação fiscal e de constrangê-lo a pagar as diferenças tributárias para que conclua o procedimento administrativo de desembaraço aduaneiro. O não recolhimento da multa e da diferença de tributos oriundos da imposição de reclassificação fiscal não tem o condão de obstar o desembaraço aduaneiro, mormente porque a liberação das mercadorias não impede o prosseguimento pelo Fisco da autuação e da futura cobrança de diferenças de tributos e multas apuradas, se for o caso.
(TRF4, AG 5047482-45.2016.4.04.0000, SEGUNDA TURMA, Relatora LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, juntado aos autos em 15/02/2017).
Além da Súmula 323/STF, a decisão viola a Tese nº 856 de Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal, onde restou firmado o entendimento de que: “é inconstitucional restrição ilegítima ao livre exercício da atividade econômica ou profissional, quando imposta como meio de cobrança indireta de tributos”.
Os casos de reclassificação fiscal são comuns e o importador pode defender a classificação adotada em processo administrativo próprio, sem que pra isso a mercadoria fique retida em recinto alfandegado, evitando a incidência de altos custos de armazenagem e demurrage.
A manutenção da decisão da Segunda Turma do TRF da 4ª Região causa insegurança jurídica e prejudica a ampla defesa do contribuinte, que se vê obrigado a recolher multa e tributos antes de poder discutir sua exigibilidade. Abre-se margem à atuações arbitrárias do Fisco, o que não deve ser admitido.
Com informações da revista Valor Econômico.
Acórdão 5002582-02.2016.4.04.7008
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Por Jaqueline Weiss e Ademir Gilli Júnior