Vários setores da economia recebem benefícios fiscais de ICMS dos Estados, sendo a grande maioria por meio da concessão de um crédito presumido de ICMS, ou seja, de uma receita do Estado que foi repassada ao contribuinte para reduzir o ICMS devido sobre suas operações.
Em resumo, o contribuinte apura o ICMS devido e paga um valor menor. Essa redução se dá por meio de um crédito presumido, que ingressa na contabilidade do contribuinte reduzindo seu passivo tributário.
Durante muitos anos se discutiu se o crédito presumido de ICMS era considerado uma subvenção para investimento ou subvenção para custeio, até que, em 2017, após a edição da Lei Complementar n. 160/2017, ficou definido que os créditos presumidos de ICMS deveriam ser tratados como subvenção para investimento.
No âmbito administrativo, a Receita Federal do Brasil sempre exigiu a tributação dos créditos presumidos de ICMS pelo IRPJ e pela CSLL, salvo quando, após a edição da LC n. 160/2017, os valores fossem lançados em conta de reserva de incentivos fiscais, respeitando as exigências da Lei n. 12.973/14 e do Decreto-Lei n. 1.598/77.
Já para os contribuintes que foram ao Judiciário, tanto no primeiro momento, anterior a LC n. 160/2017, quanto após a vigência da referida Lei Complementar, o resultado sempre foi o mesmo, de que não haveria a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os créditos presumidos de ICMS, sem qualquer tipo de restrição.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), quando se manifestou sobre o assunto, com o julgamento do EREsp n. 1.517.492, sem considerar as modificações realizadas pela LC n. 160/2017, entendeu pela impossibilidade de considerar o crédito presumido de ICMS como uma renda do contribuinte, não realizando, assim, a hipótese de incidência do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.
Para o STJ, a tributação pela União de receitas do Estado-Membro que foram concedidas ao contribuinte em forma de crédito presumido viola o pacto federativo e a segurança jurídica, levando ao esvaziamento ou redução do incentivo fiscal legitimamente outorgado pelo ente federativo.
Ainda no entender do STJ, a base de cálculo do tributo deverá sempre guardar pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter aspectos estranhos à hipótese de incidência.
Posteriormente, já se debruçando sobre as alterações promovidas pela LC n. 160/2017, que alterou a Lei n. 12.973/14 e o Decreto-Lei n. 1.598/77, o STJ (AResp n. 1.916.615) manteve o entendimento de que o crédito presumido de ICMS não se subsome a hipótese de incidência do IRPJ e da CSLL, dada sua natureza, não havendo que se falar em qualquer tipo de restrição para afastar a tributação.
Nas razões do ministro relator, Mauro Campbell Marques, são irrelevantes as alterações produzidas pelos arts. 9º e 10º da Lei Complementar n. 160/2017 sobre o art. 30 da Lei n. 12.973/14, ao adicionar-lhe os §§ 4º e 5º. Ou seja, para o STJ, é a natureza do crédito presumido que afasta a incidência do IRPJ e da CSLL e não a forma de sua contabilização.
As decisões transitadas em julgado até o momento seguem o mesmo entendimento de que o crédito presumido não deve ser tributado pelo IRPJ e pela CSLL, independente da classificação contábil adotada, afastando a tributação, inclusive, para os contribuintes optantes pelo lucro presumido.
Ocorre que, em 29 de dezembro de 2023, foi publicada a Lei n. 14.789, que revogou os dispositivos vigentes da Lei n. 12.973/14 e do Decreto-Lei n. 1.598/77, que tratavam sobre a tributação dos créditos presumidos de ICMS, sendo que, a partir de 2024, no âmbito administrativo, os créditos presumidos não poderão mais serem excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
Com isso, surge o questionamento de como devem agir os contribuintes que possuem decisões judiciais reconhecendo a não tributação desses créditos presumidos, pois as decisões fixaram que o crédito presumido de ICMS não é uma receita do contribuinte, logo, não deveria compor a base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
A conclusão parece ser simples, pois, considerando que o objeto da fundamentação jurídica do STJ foi a natureza do benefício, nenhuma modificação na legislação seria capaz de alterar o entendimento e revogar a decisão judicial, salvo a mudança da natureza do próprio benefício.
Contudo, nem sempre os Tribunais adotam o posicionamento mais correto do ponto de vista jurídico, sobretudo os Tribunais Superiores, que costumam decidir levando em consideração aspectos financeiros, o que nos motiva a concluir pela necessidade de uma nova ação judicial para estender os efeitos da decisão anterior também para os fatos geradores ocorridos após a vigência da Lei n. 14.789/23.
A necessidade de uma nova ação para que a decisão anterior se estenda também para os fatos geradores ocorridos a partir de 01/01/2024 se mostra necessária para afastar qualquer risco de questionamento por parte do fisco federal, que deverá reforçar a fiscalização sobre o crédito presumido de ICMS, sendo uma medida extremamente conservadora, pois na hipótese de o Superior Tribunal de Justiça não alterar seu entendimento até então proferido, deverá manter a não incidência do IRPJ e da CSLL sobre os créditos presumidos de ICMS mesmo após a vigência da Lei n. 14.789/23.
Gilli Basile Advogados permanece à disposição de seus clientes e parceiros para esclarecer os procedimentos que devem ser adotados.