O Superior Tribunal de Justiça (STJ) adotou ontem o entendimento sobre a quebra de decisões definitivas enquanto os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) ainda finalizavam o julgamento. Os ministros levaram em consideração que não foi aplicada pelo STF a chamada “modulação de efeitos” e deram razão à Fazenda Nacional em uma disputa bilionária.
O julgamento foi realizado pela 1ª Seção — que dá a última palavra em direito tributário no STJ. Foi analisada ação rescisória ajuizada para reverter decisões que dispensam contribuintes catarinenses de recolher IPI na revenda de importados.
A ação rescisória foi movida contra o Sindicato das Empresas de Comércio Exterior do Estado de Santa Catarina (AR 6015). A entidade obteve, em abril de 2015, uma decisão definitiva para que os seus filiados não precisassem pagar o tributo. O processo da Fazenda Nacional tem como base decisão posterior do Supremo em sentido contrário.
O impacto é alto. Segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), apenas seis pedidos de expedição de precatórios apresentados à Justiça por empresas filiadas ao sindicato superaram R$ 3,6 bilhões. O órgão passou a buscar a reversão dos processos com o trânsito em julgado depois do prazo de um ano e meio em que o entendimento foi favorável aos contribuintes.
A discussão no STJ tomou corpo antes de o Supremo formar maioria, na semana passada, pela quebra de decisões judiciais definitivas quando há mudança de jurisprudência. Com o julgamento do STF, o contribuinte que discutiu a cobrança de um tributo na Justiça e teve a ação encerrada a seu favor vai perder esse direito se, no futuro, a Corte analisar novamente o tema e decidir que a cobrança é devida.
A maioria dos ministros do Supremo votou pela quebra. Vale a partir da reversão da jurisprudência pela Corte, respeitadas as anterioridades anual e nonagesimal (de 90 dias).
No STJ, estava em discussão o uso da chamada ação rescisória para reabrir processos já encerrados (transitados em julgado) quando há mudança de jurisprudência. O pedido foi aceito depois de diversos ministros citarem o entendimento do Supremo sobre o tema.
O relator da ação, ministro Gurgel de Faria, foi um deles. Ele votou para que a rescisória fosse conhecida. Sobre a tese do IPI, afirmou que há precedentes tanto do STJ, de 2015, quando do STF, de 2020, no sentido de que é possível a dupla incidência de IPI em operações realizadas pelo importador, tanto no desembaraço do bem industrializado como na saída do bem do importador para revenda no mercado interno.
Gurgel destacou que, seguindo entendimento do STF, aplicaria como marco para reversão da decisão anterior a data do julgamento da repercussão geral. “Seria o julgamento do Supremo ou do STJ? Como o Supremo entendeu que é assunto constitucional, a última palavra é do Supremo”, disse ele, considerando que nessa tese especificamente existem precedentes das duas Cortes no mesmo sentido, julgados em datas diferentes.
“Não há como não votar acompanhando o relator considerando o precedente de eficácia vinculante no mérito”, afirmou a ministra Regina Helena Costa. Ela ficou vencida quanto ao conhecimento — um grupo de ministros entendia que não caberia ação rescisória nesse caso e nem seria mais necessária depois da decisão do Supremo. Além dela, adotaram esse posicionamento os ministros Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães.
Para Regina Helena Costa, “a cessação dos efeitos (de uma decisão) se dará automaticamente com a fixação de tese contrária pelo STF”. Ainda segundo a ministra, a partir do entendimento do STF deverá ocorrer uma redução no número de rescisórias, que não serão mais necessárias. Ela reforçou que a coisa julgada individual é válida até a definição de tese pelo STF, sem precisar de uma ação para desconstituí-la.
Apesar da divergência quanto ao conhecimento da ação — possibilidade dessa reversão ser feita por meio de ação rescisória — a decisão do STJ foi unânime para aceitar o pedido da Fazenda Nacional no caso, pela aplicação da jurisprudência atual do STF sobre a tese do IPI.
Fonte: VALOR