[…] a presença de um terceiro envolvido – o encomendante do encomendante predeterminado – não é vedada pela legislação, não descaracteriza a operação de importação por encomenda, e, portanto, não é obrigatória sua informação na Declaração de Importação, desde que as relações estabelecidas entre os envolvidos na importação indireta representem operações efetivas de compra e venda de mercadorias.
Com esta conclusão, a COSIT respondeu à formulação de consulta de contribuinte que pretende realizar operação de importação por encomenda em que o encomendante predeterminado já tem um encomendante também definido.
A dúvida é bastante comum entre as empresas que realizam importações na modalidade por encomenda e até então não havia um posicionamento fiscal claro acerca de situações como esta.
O desenho da operação é aquele em que o encomendante predeterminado recebe um pedido de um de seus clientes e, para atender este pedido, encomenda a importação de uma empresa importadora. A empresa importadora negocia a compra com o fornecedor estrangeiro, realiza a importação e nacionalização das mercadorias em seu nome e com seus próprios recursos, declarando a destinação ao encomendante já nos documentos da importação, e revende as mercadorias ao encomendante que, por sua vez distribui ou revende aos seus clientes que realizaram o pedido de compra em primeiro lugar.
Ilustra-se o exemplo:
- A loja “A” recebe três clientes que desejam o produto “X”, de origem importada;
- “A” não tem o produto “X” à pronta entrega e por isso entra em contato com “B” para encomendar as mercadorias;
- “B”, após receber o pedido de “A”, contata a importadora “C” para encomendar a importação do produto “X”;
- “C” contata o fornecedor estrangeiro “D”, negocia a importação e adquire os produtos “X”;
- “D” envia os produtos para “C”, que promove a nacionalização da importação em seu nome;
- “C” revende os produtos para “B” no mercado interno;
- “B” compra os produtos de “C” e depois os revende para “A”;
- “A” compra os produtos de “B” e os vende aos seus clientes interessados, encerrando a operação.
Pelas regras da importação por encomenda, a fatura comercial, o conhecimento de transporte e a Declaração de Importação (os demais documentos instrutivos da operação também, quando necessário), devem indicar, no exemplo: “B” (encomendante), “C” (importadora) e “D” (exportador).
A dúvida, portanto, é se seria necessário informar a participação de “A” na operação, uma vez que já era conhecida antes mesmo do início da operação.
O receio de realizar a operação nestes moldes se justificava especialmente pela possibilidade de caracterização da infração aduaneira de interposição fraudulenta, diante da suposta “ocultação” do real interessado nas mercadorias, papel ocupado por “A” no exemplo acima.
Ao responder à consulta formulada, a COSIT fez referência à Nota Coana nº 76/2020, segundo a qual:
Não há norma disciplinando a situação “e nem deveria existir, uma vez que a existência de um possível ‘encomendante do encomendante predeterminado’, situação não vedada pela legislação, não descaracteriza nem modifica a operação de importação por encomenda, e por isso não precisa ser informada à RFB”.
A análise prossegue citando que:
[…] o encomendante do encomendante predeterminado encontra-se distante o suficiente da operação de importação a ponto de o legislador não o trazer para a relação tributária, seja em relação aos tributos incidentes na operação de importação, seja em relação ao IPI na saída do estabelecimento dos produtos importados.
Diante disto, a Solução de Consulta COSIT nº 158/2021 concluiu que a preexistência do “encomendante do encomendante”: (i) não é vedada pela legislação; (ii) não descaracteriza a importação por encomenda; e (iii) não precisa ser informada na Declaração de Importação.
Logo, a operação utilizada como exemplo é lícita e a figura de “A” não precisa ser declarada na importação.
É preciso ressaltar, no entanto, que para que o desenho de operação seja considerado válido nos termos do entendimento fiscal todas as etapas precisam retratar relações comerciais válidas e autênticas. A utilização deste modelo como meio simulatório ou fraudulento, invariavelmente caracterizará infração aduaneira de ocultação e/ou interposição fraudulenta, punível com o perdimento das mercadorias ou sua multa substitutiva.
A Solução de Consulta também expõe que não há vedação legal para que este tipo de operação tenha partes nacionais com alguma vinculação societária entre si. Apesar disto, também nesses casos é necessário que todas as empresas possuam legitimidade e capacidade financeira independente para a realização da operação, de modo a afastar a caracterização de infração aduaneira.
Ao final a SC COSIT nº 158/2021 esclareceu uma outra dúvida costumeira nas importações realizadas por encomenda ou conta e ordem de terceiros: o fluxo do estoque:
[…] a legislação aduaneira de regência não estabelece prazo mínimo para permanência de mercadoria importada em estoque, seja por parte do importador ou por parte do encomendante. Assim, o curto tempo de permanência de mercadoria em estoque não tem o condão de, isoladamente, desqualificar modalidade de importação indireta.
Gilli Basile Advogados permanece à disposição de todos os interessados em maiores esclarecimentos.
Por Jaqueline Weiss.