Como garantir importações seguras em 2024 e iniciar o ano com o pé direito
É antiga nossa preocupação em alertar os importadores quanto às situações que caracterizam interposição fraudulenta. Em um artigo anterior sobre o tema (leia aqui), detalhamos a infração e apresentamos exemplos práticos de quando a interposição é considerada fraudulenta.
Esta infração, punida com a perda de bens, a penalidade mais severa do comércio exterior, está sempre em destaque e precisa de atenção. Por esse motivo, abordamos novamente o assunto para garantir que suas importações em 2024 comecem com as devidas precauções.
Sabe-se que a infração tem duas vertentes, assim encaradas pela Receita Federal:
- Interposição fraudulenta presumida – quando se considera que não foi a importadora declarada que realizou a operação, pois não há comprovação da origem, disponibilidade e transferência de recursos empregados na importação. Neste caso, o ônus probatório recai sobre o importador, que precisa demonstrar a origem, a disponibilidade e a transferência de recursos.
- Interposição fraudulenta comprovada – quando há fraude ou simulação com o intuito de interpor determinada pessoa entre o real adquirente e as autoridades fiscais, para que a primeira permaneça oculta perante a fiscalização. O ônus da prova, nesta situação, é da autoridade fiscal, que precisa apresentar elementos probatórios suficientes de que a operação se deu mediante fraude para ocultar o real adquirente.
Acompanhamos diversos processos de fiscalização que culminaram com a aplicação da pena de perdimento, o que nos leva a monitorar as atualidades sobre o tema, especialmente o entendimento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) no julgamento de recursos administrativos.
Destacamos inicialmente o Acórdão 3401-012.373, proferido em 24/08/2023, em que o CARF analisou uma importação por conta própria em que houve o repasse direto e imediato das mercadorias importadas, para o cliente no mercado interno.
Na oportunidade, o Conselho considerou lícita a realização de importação mediante prévia encomenda e expectativa de demanda, com o consequente repasse direto ou imediato das mercadorias por ocasião de sua nacionalização, sem que tal prática descaracterize a realização da importação por conta própria, ou configure interposição fraudulenta de terceiros. Contudo, neste caso ficou provado que a empresa importadora intervinha de forma exclusiva nos atos de execução da importação, sem qualquer participação do adquirente da mercadoria.
Ainda, o CARF reconheceu que a antecipação parcial de recursos, antes do registro da DI, ou a transferência de valor a título de pagamento, no exato dia do fechamento do contrato de câmbio pela importadora, também não são fatos capazes de caracterizar, isoladamente, a ocultação do real adquirente e/ou interposição fraudulenta. Isto porque, a infração se verifica quando se busca, inequivocamente, alterar ou excluir os atos ou negócios jurídicos constitutivos da sujeição passiva ou da posição de responsável pela importação, devendo existir uma evidente incompatibilidade entre o negócio declarado e sua efetivação no plano fático.
Já no Acórdão 3302-013.835, de 24/10/2023, o CARF afirma que, para aplicação da multa substitutiva da pena de perdimento, é imprescindível a comprovação da fraude ou simulação negocial, na realização de operações de importação, tendente à ocultação dos reais adquirentes das mercadorias. Ou seja, a referida infração não se configura quando os envolvidos na operação estiverem respaldados em contratos comerciais válidos, possuírem capacidade econômico-financeira e operacional para realização das operações.
No caso acima, o Conselho concluiu pelo cancelamento da autuação diante do acervo probatório trazido pela importadora, pois as atividades foram consideradas lícitas, promovidas em compasso com as ideias de livre iniciativa privada e autonomia de vontade, sem qualquer mácula de caráter aduaneiro e/ou fiscal.
Por outro lado, em vários outros precedentes desfavoráveis aos contribuintes, o CARF mantém as autuações impondo a pena de perdimento, quando a fiscalização aduaneira comprova a ocorrência de interposição fraudulenta, a partir de documentação que atesta a intenção (dolo) de ocultação dos envolvidos na importação.
A análise dos julgamentos administrativos mostra que, para concluir pela ocorrência de ocultação dos reais beneficiários de operações de comércio exterior, o Fisco analisa vários detalhes. Portanto, o devido acompanhamento da fase de fiscalização e a elaboração de defesa por advogado especializado na área são fatores determinantes para aumentar as chances de derrubar o auto de infração.
Além disso, é essencial que os importadores adotem as seguintes cautelas para evitar a caracterização de uma interposição fraudulenta e, principalmente, arquivem todas as informações e documentos atrelados a cada importação, caso no futuro necessitem apresentar ao Fisco em processo de fiscalização:
- manter estrutura operacional adequada: ter sede própria (se possível, evitar coworking), com comprovação de pagamento de aluguel (se for o caso), energia elétrica, internet e telefone, além de possuir funcionários trabalhando no local;
- comprovar a origem dos recursos utilizados na integralização do capital social, a origem dos recursos empregados nas operações, bem como a capacidade de armazenagem (ou explicação sobre as questões logísticas);
- retratar na Declaração de Importação, de forma fidedigna, a operação realizada; ou seja, se é conta própria, conta e ordem de terceiros ou encomenda;
- comprovar a negociação com o exportador, em especial a realizada pela importadora/trading no caso de encomenda;
- formalizar contrato de importação específico, especialmente na encomenda;
- na encomenda, comprovar que os recursos utilizados foram próprios da trading e que o pagamento ao fornecedor estrangeiro necessariamente foi realizado por ela (contrato de câmbio);
- evitar, se possível, adiantamento de recursos pela encomendante, e comprovar os subsequentes pagamentos da importadora/encomendante à trading;
- manter arquivados todos os documentos de cada operação (tais como: pedidos formulados ao exportador, invoice, contrato de câmbio, contrato de importação por encomenda, DI, notas fiscais de venda interna, conhecimentos de transporte, etc).
Por fim, salientamos que é extremamente importante que as Tradings fiquem atentas a estes detalhes, mesmo em operações por conta e ordem de terceiros, pois serão solidariamente responsáveis pela pena de perdimento ou sua multa substitutiva.
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Por Bruna Luiza Gilli Baumgarten