Não compete ao vendedor perseguir o destino do produto para conferir se o comprador foi o real destinatário do bem. Com esse entendimento, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça definiu nesta quarta-feira (14/3) que o fisco precisa comprovar que a empresa participou intencionalmente de eventual infração para ser responsabilizada a pagar diferença de ICMS em operação interestadual de comércio.
Para o colegiado, se a vendedora agiu de boa-fé, deve ser afastada sua conduta culposa. Logo, a empresa não tem responsabilidade objetiva no pagamento da diferença do imposto. “Com apresentação de nota fiscal, não é exigível a fiscalização do itinerário”, disse o ministro Gurgel de Faria, relator do caso.
Processos do tipo têm sido recorrentes no Judiciário de São Paulo, em razão de diversas autuações fiscais lavradas contra empresas de setores como de bebidas, combustíveis e perfumes. Nesses casos, a Fazenda cobra diferença se falta comprovação de que a mercadoria transpôs a divisa estadual e chegou de fato ao comprador. O estrago para as finanças das empresas é grande: a alíquota de ICMS interestadual é de 7%, bem mais baixa do que a para comércio dentro dos limites do estado, que é de 18%.
Para ministro Gurgel de Faria, empresa não tem responsabilidade objetiva no pagamento da diferença do ICMS.
A decisão foi tomada na análise de embargos de divergência. A empresa que levou o caso ao STJ questionou acórdão do Tribunal de Justiça paulista que dava razão ao fisco. Para o TJ-SP, a empresa deve pagar a diferença, não importando se ela agiu de boa-fé.
A 1ª Seção cassou essa decisão, e um novo julgamento de apelação deverá agora ser feito pelos desembargadores paulistas.
A autora do recurso apontou diferença de entendimento entre as turmas que julgam Direito Público na corte. A 2ª Turma entendia que, independente da boa fé ou não da empresa, não ficaria excluída a sua responsabilidade em caso de suposta fraude o fato da operação ter sido feita na modalidade em que o comprador assume todos os riscos e custos com o transporte da mercadoria.
Já a 1ª Turma julgava no sentido de que, não tendo o vendedor efetivamente praticado qualquer infração tributária, não haveria como atribuir-lhe, sem a demonstração da necessária conduta ilícita, a alegada responsabilidade pela diferença de ICMS. “Ninguém sai atrás do caminhão para ver se ele passou a divisa estadual. Quando a mercadoria sai do estabelecimento do vendedor ocorre o fato gerador da operação interestadual de ICMS”, disse à ConJur o tributarista Daniel Corrêa Szelbracikowski da Advocacia Dias de Souza.
Ele explica que se o comprador ou o transportador transmitem a mercadoria a terceiro dentro do território do estado de origem, ocorre um outro fato gerador, relativo à operação interna. “Exclusivamente deles é que pode ser exigido o ICMS”, acrescentou.
Leia a ementa provisória da decisão (sem revisão, divulgada no término do julgamento):
1) A empresa agiu de boa-fé. É afastada a conduta culposa da empresa vendedora e ela não tem responsabilidade objetiva no pagamento da diferença do ICMS. Com apresentação de nota fiscal, não é exigível a fiscalização do itinerário.
2) O Fisco precisa comprovar que a empresa vendedora participou intencionalmente de eventual infração para que ela seja responsabilizada.
3) O acórdão estadual entendeu que não depende se a empresa vendedora agiu de boa-fé. A decisão do Tribunal deve ser cassada. Novo julgamento de apelação, levando em consideração esse elemento subjetivo.
4) Embargos de divergência acolhidos, por unanimidade.
EREsp 1.657.359
Marcelo Galli
Fonte: Conjur