O perdimento das mercadorias é a penalidade mais severa aplicada em operações de comércio exterior e visa punir as infrações aduaneiras consideradas danosas ao erário, dada sua gravidade e prejudicialidade.
O artigo 105 do Decreto-Lei nº 37/66 prevê algumas das hipóteses em que a pena de perdimento é aplicável:
Art. 105. Aplica-se a pena de perda da mercadoria:
I – Em operação de carga já carregada em qualquer veículo ou dêle descarregada ou em descarga, sem ordem, despacho ou licença, por escrito, da autoridade aduaneira ou não cumprimento de outra formalidade essencial estabelecida em texto normativo;
II – Incluída em listas de sobressalentes e previsões de bordo quando em desacôrdo, quantitativo ou qualitativo, com as necessidades do serviço e do custeio do veículo e da manutenção de sua tripulação e passageiros;
III – Oculta, a bordo do veículo ou na zona primária, qualquer que seja o processo utilizado;
IV – Existente a bordo do veículo, sem registro um manifesto, em documento de efeito equivalente ou em outras declarações;
V – Nacional ou nacionalizada, em grande quantidade ou de vultoso valor, encontrada na zona de vigilância aduaneira, em circunstâncias que tornem evidente destinar-se a exportação clandestina;
VI – Estrangeira ou nacional, na importação ou na exportação, se qualquer documento necessário ao seu embarque ou desembaraço tiver sido falsificado ou adulterado;
VII – Nas condições do inciso anterior, possuída a qualquer título ou para qualquer fim;
VIII – Estrangeira que apresente característica essencial falsificada ou adulterada, que impeça ou dificulte sua identificação, ainda que a falsificação ou a adulteracão não influa no seu tratamento tributário ou cambial;
IX – Estrangeira, encontrada ao abandono, desacompanhada de prova do pagamento dos tributos aduaneiros, salvo as do art. 58;
X – Estrangeira, exposta à venda, depositada ou em circulação comercial no país, se não fôr feita prova de sua importação regular;
XI – Estrangeira, já desembaraçada e cujos tributos aduaneiros tenham sido pagos apenas em parte, mediante artifício doloso;
XII – Estrangeira, chegada ao país com falsa declaração de conteúdo;
XIII – Transferida a terceiro, sem o pagamento dos tributos aduaneiros e outros gravames, quando desembaraçada nos têrmos do inciso III do art. 13.
XIV – Encontrada em poder de pessoa natural ou jurídica não habilitada, tratando-se de papel com linha ou marca d’água, inclusive aparas;
XV – Constante de remessa postal internacional com falsa declaração de conteúdo;
XVI – Fracionada em diversas remessas postais internacionais, de modo a iludir o pagamento, no todo ou em parte, do impôsto de importação;
XVII – Estrangeira, em trânsito no território aduaneiro, quando o veículo terrestre que a conduzir, desviar-se de sua rota legal, sem motivo justificado;
XVIII – Estrangeira, acondicionada sob fundo falso, ou de qualquer modo oculta;
XIX – Estrangeira, atentatória, à moral, aos bons costumes, à saúde ou ordem públicas.
Adicionalmente, o Decreto-Lei nº 1.455/76 consolida as situações do artigo 105 do Decreto nº 37/66 como lesivas ao erário, além de prever novas hipóteses, das quais destacam-se o abandono das mercadorias – caracterizado quando a carga excede os prazos previstos de permanência em recintos alfandegados sem que sejam iniciados os trâmites aduaneiros correspondentes – e a ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou do responsável pela operação de comércio exterior, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros.
A ocultação mediante interposição fraudulenta é provavelmente a infração aduaneira mais comumente apurada pela Fiscalização, que enquadra as operações de comércio exterior em que há qualquer tipo de ocultação, de modo a aplicar o perdimento às mercadorias. Ocorre, no entanto, que a simples ocultação não é suficiente à aplicação do perdimento, sendo necessário comprovar a ocorrência dos elementos de fraude ou simulação.
Nestes casos, é de suma importância que os importadores apresentem defesa administrativa, oportunidade na qual podem produzir provas da legitimidade e legalidade das operações, de modo a desconstituir a infração e a aplicação da pena.
O procedimento administrativo de aplicação da pena de perdimento muitas vezes é precedido de Procedimento Especial de Controle Aduaneiro – PECA, conforme abordamos no #ComexLaw 14, inicia-se com a lavratura de auto de infração, momento em que as mercadorias – se já não o tiverem sido no PECA -, são normalmente retidas em nome e guarda do Ministro da Economia. Na sequência é aberto o prazo de defesa de 20 dias, e depois ocorre o julgamento em instância única, tudo conforme previsão do artigo 27 do Decreto-Lei nº 1.455/1976.
Trata-se de um procedimento mais rápido do que o procedimento comum de julgamento dos processos administrativos fiscais, previsto no Decreto nº 70.235/72. A celeridade do procedimento de perdimento, de um lado, visa resolver a situação da carga apreendida, principalmente em razão dos altos custos de armazenagem e manutenção em recinto alfandegado. Por outro lado, muito se discute acerca da legalidade do procedimento, já que não é oportunizado ao importador recorrer da decisão do julgamento.
Tal situação deve se alterar em breve, dada a recente internalização da Convenção de Quioto pelo Brasil. Referido acordo internacional exige dos países signatários que seja prevista possibilidade de recurso para o perdimento das mercadorias. Como a legislação nacional ainda não foi alterada, é possível buscar na justiça o direito ao recurso, mediante a aplicação do rito previsto no Decreto nº 70.235/72.
Hipótese diversa compreende levar a discussão relativa ao perdimento diretamente para a esfera judicial, mediante ação anulatória de ato administrativo. Em sendo possível comprovar a legalidade da operação, a ação judicial pode proibir a destinação das mercadorias declaradas perdidas ou prever indenização pela perda sofrida pelo dono da carga.
Outro aspecto de menção importante é que nos casos de perdimento das mercadorias, é possível requerer a restituição dos tributos aduaneiros recolhidos, uma vez que com a apreensão das mercadorias, não ocorrem os fatos geradores dos referidos tributos.
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Por Jaqueline Weiss