No Brasil, a Receita Federal e os demais órgãos intervenientes possuem o dever de garantir a regularidade das operações de comércio exterior por meio de ampla fiscalização, objetivando o combate a eventuais fraudes e assegurando, inclusive, a correta apuração e recolhimento dos tributos aduaneiros.
Atualmente existem dois procedimentos especiais de fiscalização aduaneira, sendo que um deles está previsto na Instrução Normativa nº 228/2002 – e busca a verificação da origem dos recursos aplicados nas operações de comércio exterior e combate a interposição fraudulenta de pessoas –, enquanto o outro está previsto na Instrução Normativa nº 1.169/2011 – e estabelece procedimentos especiais de controle na importação ou na exportação, diante de suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento.
Via de regra, ambos os procedimentos, alternativamente, são instaurados quando a mercadoria for parametrizada para o canal cinza de conferência aduaneira. No entanto, a legislação prevê que a seleção da Declaração de Importação para quaisquer dos canais de conferência aduaneira não impede que a fiscalização proceda com a ação fiscal pertinente se houverem indícios que ensejam a aplicação de procedimento aduaneiro especial.
- Procedimento da Instrução Normativa 228/2002
O procedimento da IN nº 228/2002 tem como objetivo fiscalizar a pessoa jurídica, verificando a origem dos recursos aplicados nas operações de comércio exterior e investigando eventual ocultação de pessoas envolvidas na operação.
Ou seja, o foco é a fiscalização dos casos em que há manifesta incompatibilidade entre os volumes transacionados no comércio exterior com a capacidade econômica e financeira (origem licita dos recursos empregados).
Este procedimento é instaurado no curso do procedimento de fiscalização amparado por Termo de Distribuição de Procedimento Fiscal de Fiscalização (TDPF-F), mediante termo de início, com ciência da parte fiscalizada, contendo as possíveis irregularidades que motivaram a instauração.
Desta forma, verifica-se que a fiscalização deverá motivar o ato, não podendo apresentar fundamentação genérica.
Durante o procedimento, a empresa fiscalizada será intimada para comprovar, no prazo de 20 dias, o efetivo funcionamento e condição de real adquirente ou vendedor das mercadorias, bem como a origem lícita, disponibilidade e a efetiva transferência, se for o caso, dos recursos necessários à prática das operações.
Referido procedimento deverá ser concluído no prazo de 90 dias, contado da ciência do termo de início, podendo ser prorrogado por igual período em situações devidamente justificadas.
A legislação também prevê a possibilidade de liberação das mercadorias mediante prestação de garantia equivalente ao preço da mercadoria acrescido do frete e seguro internacional, que deverá ser prestada em favor da União e ficará sob sua guarda até a conclusão do procedimento. Há previsão de que a garantia deve ser prestada no prazo de 10 dias úteis contados da data de instauração do procedimento especial ou da data do registro da DI, quando já tiver iniciado o despacho aduaneiro.
Por fim, concluído o procedimento especial, aplicar-se-á a pena de perdimento das mercadorias objeto das operações, na hipótese de ocultação do verdadeiro responsável pelas operações (interposição presumida), caso descaracterizada a condição de real adquirente ou vendedor das mercadorias, ou na hipótese de interposição fraudulenta (comprovada), em decorrência da não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados.
- Procedimento da Instrução Normativa 1.169/2011
O Procedimento Especial de Controle Aduaneiro (PECA) previsto na IN nº 1.169/2011 aplica-se a toda operação de importação ou exportação sobre a qual recaia suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento, independentemente de ter sido iniciado o despacho aduaneiro ou deste já ter sido concluído.
O art. 2º da referida Instrução Normativa prevê que as suspeitas de irregularidade compreendem as seguintes situações:
Art. 2º […]
I – autenticidade, decorrente de falsidade material ou ideológica, de qualquer documento comprobatório apresentado, tanto na importação quanto na exportação, inclusive quanto à origem da mercadoria, ao preço pago ou a pagar, recebido ou a receber;
II – falsidade ou adulteração de característica essencial da mercadoria;
III – importação proibida, atentatória à moral, aos bons costumes e à saúde ou ordem públicas;
IV – ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiro;
V – existência de fato do estabelecimento importador, exportador ou de qualquer pessoa envolvida na transação comercial; ou
VI – falsa declaração de conteúdo, inclusive nos documentos de transporte.
Além disso, a legislação prevê que o procedimento deverá ser instaurado pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal através de termo de início de fiscalização, que deve conter as irregularidades que motivaram a instauração e indicar quais as mercadorias/declarações são objeto do procedimento, com a respectiva ciência da pessoa fiscalizada.
No entanto, em que pese a necessidade de listar as supostas irregularidades, existem diversos casos em que o procedimento é instaurado sem a devida motivação, no qual a fiscalização apenas menciona que pretende apurar eventual conduta punível com a pena de perdimento de forma genérica e subjetiva, em flagrante violação ao princípio da legalidade do ato administrativo.
Ao instaurar o procedimento, a autoridade aduaneira poderá realizar diligências, solicitar laudo técnico, verificar a autenticidade do certificado de origem ou intimar o importador/exportador para apresentar informações e documentos para auxiliar na análise.
Cabe destacar que, em regra, a mercadoria submetida ao PECA fica retida até a conclusão do correspondente procedimento de fiscalização, que deverá ser concluído no prazo máximo de 90 (noventa) dias, podendo ser prorrogado por igual período em situações devidamente justificadas.
Por outro lado, se as irregularidades que motivaram o procedimento forem relativas a ocultação do sujeito passivo, real vendedor, comprador ou responsável pela operação, e quanto a existência de fato do estabelecimento importador, exportador ou de qualquer pessoa jurídica envolvida na operação, a mercadoria poderá ser desembaraçada ou entregue antes do término do procedimento mediante a prestação de garantia.
Esta possibilidade é utilizada como fundamento, especialmente pelos importadores, para solicitar nas vias administrativa e judicial a liberação das mercadorias mediante prestação de caução.
Ao término da fiscalização, se for constatada a prática dos ilícitos apontados, a autoridade irá lavrar o Auto de Infração com a decretação da pena de perdimento das mercadorias. Por outro lado, se restar comprovado que o importador não cometeu as referidas irregularidades, o importador/exportador ainda assim terá que arcar com as despesas portuárias e os lucros cessantes das mercadorias não comercializadas e apreendidas no período.
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Por Larissa Mohr