Sabe-se que a cobrança de armazenagem e de sobreestadia de contêineres (demurrage), é um dos temas que mais geram desconforto aos importadores e aos operadores da cadeia logística.
Estes gastos inesperados podem alcançar cifras altíssimas, não raras vezes até maior que o valor da mercadoria importada.
Quanto à demurrage, ocasionalmente a cobrança é contestada administrativamente por meio de dispute perante as companhias de navegação marítima, no entanto, dificilmente a cobrança é afastada, obtendo-se, no máximo, algum desconto em determinadas situações justificadas.
Para evitar dores de cabeça, comumente a dívida acaba sendo paga, tornando-se um alto prejuízo ao importador.
Ocorre que, em determinadas situações, a cobrança de armazenagem e demurrage dos importadores é indevida, sendo cabível o ajuizamento de ação para buscar o cancelamento da cobrança, ou, então, o ressarcimento de valores caso o pagamento já tenha sido realizado.
Neste artigo nosso objetivo é demonstrar alguns casos em que estes gastos foram gerados por culpa de terceiros e que não devem ser suportados pelos importadores.
- Problemas fitossanitários nos pallets de madeira
A inspeção sanitária dos suportes de madeira pode gerar a interrupção do despacho aduaneiro e, por vezes, impactar no prazo para devolução dos contêineres.
Quando ficar comprovado que o agente de cargas ou o próprio transportador estavam cientes de eventuais irregularidades nos pallets (presença de pragas, ausência ou irregularidade na marca IPPC, ausência ou irregularidade no certificado fitossanitário etc.), e mesmo assim, sem noticiar o importador, autorizaram o embarque/transporte, devem ser responsabilizados pelos consequentes prejuízos sofridos pelo importador.
Assim, caso o atraso no processo de importação e respectiva cobrança de armazenagem e demurrage decorram de problemas fitossanitários nos suportes de madeira utilizados para acondicionar a carga transportada, não cabe ao importador suportar tal ônus.
- Falta de disponibilidade dos depósitos para recepção de contêineres vazios
Muitos importadores têm enfrentado dificuldades para a devolução dos contêineres vazios nos depósitos designados pelos armadores (DEPOT’s).
Nestes casos, devido à superlotação desses depósitos e à falta de disponibilização de datas para agendamento da devolução das unidades de carga, pode ocorrer o decurso do prazo free time acordado com os armadores, resultando na cobrança de demurrage.
No entanto, de acordo com as normas da ANTAQ, deve haver a suspensão da contagem do prazo de livre estadia do contêiner nos casos em que o transportador marítimo, o proprietário do contêiner, ou o depósito de contêineres (DEPOT) são diretamente responsáveis pelo atraso.
Assim, cabe aos importadores questionarem esta cobrança de demurrage, ou então ajuizarem ação contra a parte que deu causa ao atraso, visando o ressarcimento dos valores pagos.
- Outros atos das partes envolvidas na operação
Além dos casos específicos acima relatados, existem várias outras situações em que não cabe a responsabilização dos importadores pela demora da devolução de contêineres ou pela armazenagem extra, como por exemplo quando há retenção indevida da carga, o impedimento e a demora excessiva para desunitização pelo Recinto Alfandegado etc.
Nestes casos, se comprovado o ato imputável a terceiro, as cobranças não devem ser arcadas pelos importadores.
Aqui, vale a pena relembrar a grave situação enfrentada por várias empresas no Porto de Imbituba, que recebeu cargas originalmente destinadas a Itajaí e Navegantes, em virtude das chuvas ocorridas na região que culminaram no fechamento do canal de acesso aos Portos.
Ocorre que a empresa responsável pela operação do Porto de Imbituba (Santos Brasil), optou por receber as cargas mesmo sem ter estrutura apta para tanto, o que ocasionou um verdadeiro caos na movimentação de containers no Terminal e, consequentemente, elevados prejuízos a importadores a título de armazenagem, demurrage etc.
Inclusive, recentemente o Poder Judiciário passou a decidir as demandas ingressadas contra a Santos Brasil, já havendo sentenças favoráveis aos importadores, reconhecendo o direito à reparação pelos danos materiais sofridos.
- Atos da Receita Federal e órgãos anuentes
Períodos de greve, operação padrão, exigências equivocadas para reclassificação fiscal e retificações na DI, interrupção descabida do despacho aduaneiro, retenção indevida de mercadorias, demora na apreciação de licenças, dentre outros atrasos injustificados praticados pela Receita Federal e órgãos anuentes, também impactam em gastos extras com armazenagem e demurrage arcados pelos importadores.
Quando ficar devidamente comprovada a demora excessiva para as autoridades aduaneiras praticarem atos de sua competência, além do prazo legalmente estipulado, é cabível o ajuizamento de ação, contra a União ou o órgão responsável, para buscar o ressarcimento de valores pagos a título de armazenagem e demurrage.
Especificamente quanto ao prazo para conclusão do despacho aduaneiro, quando ausente qualquer providência por parte do importador, é pacífica a jurisprudência no sentido de que, comprovada a omissão da autoridade fiscal em concluir o despacho dentro de 8 dias, surge o dever da União de indenizar o importador pelo excesso de prazo e respectivos prejuízos daí decorrentes.
Naturalmente estas demandas judiciais dependem de provas em favor dos importadores, e cada situação deve ser analisada individualmente. Mas, quando ficar evidente e for possível comprovar que os gastos excessivos com armazenagem e demurrage se deram por falha nas atividades de terceiros, ou até mesmo pela indevida retenção das mercadorias por parte da Receita Federal, os importadores podem buscar o Poder Judiciário para recuperar os valores pagos.
É essencial que os importadores estejam atentos às situações em que o Poder Judiciário vem julgando como viável o ressarcimento e os requisitos indispensáveis para tanto, cuja ação para reaver o prejuízo deve ser ajuizada no prazo de 5 anos.
Já se deparou com alguma das situações acima?
A equipe aduaneira do Gilli Basile Advogados está à disposição para outras informações sobre o tema.
Por Bruna Luiza Gilli Baumgarten
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