Em decisão publicada hoje, 16 de setembro de 2020, o Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1090591 em sessão do plenário virtual, fixou a seguinte tese de repercussão geral:
É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal.
No caso em julgamento, a Receita Federal promoveu a retenção das mercadorias importadas sob alegação de subfaturamento, condicionando a liberação das mercadorias ao pagamento de multa e tributos complementares ou mediante o depósito de caução correspondente.
A jurisprudência majoritária do Tribunal Regional Federal da 4ª Região era firme no sentido de ser incabível condicionar o desembaraço aduaneiro de bens importados ao pagamento de diferenças apuradas por arbitramento da autoridade fiscal, fundamentando-se na Súmula 323 do STF, que proíbe a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. Em face de decisão neste sentido, a União interpôs o mencionado Recurso Extraordinário, objeto da Repercussão Geral.
A decisão do STF, que é vinculativa aos demais órgãos do Poder Judiciário, altera o posicionamento até então adotado pelo TRF da 4ª Região, impondo que os importadores passem a recolher as diferenças tributárias impostas como condição ao desembaraço aduaneiro e liberação de suas mercadorias.
O relator do Acórdão, Ministro Marco Aurélio, consignou que o pagamento de tributo constituiria elemento essencial ao desembaraço aduaneiro em razão de previsão contida no Regulamento Aduaneiro, utilizando tal fundamento – contido em ato normativo infralegal – como razão de decidir. Aduziu ainda que no caso em julgamento “não está em jogo apreensão de mercadorias como meio coercitivo visando a satisfação de débito tributário“.
Também apresentou voto o Ministro Alexandre de Moraes que, acompanhando o relator, destacou o contexto em que se baseou a Súmula nº 323 do STF como diverso da situação em julgamento, já que aquele verbete vedaria a utilização de sanções políticas como meio coercitivo para pagamento de tributos, o que não ocorreria no procedimento de despacho aduaneiro. Justificou seu voto na situação de que o recolhimento de diferenças tributárias decorreria da impossibilidade da conclusão do despacho aduaneiro antes de preenchidos todos os requisitos legais para a internalização dos bens, nos quais estaria incluído o pagamento dos encargos tributários.
Inegavelmente a decisão representa um retrocesso aos importadores, já que os importadores precisarão arcar com valores de diferenças tributárias, mesmo antes da efetiva discussão administrativa – momento em que podem exercer o contraditório e ampla defesa -, abrindo espaço para arbitrariedades pelo Fisco.
O caso concreto em julgamento abordava situação de subfaturamento, porém a decisão impacta também nos casos de reclassificação fiscal e de outras situações que ocorrem no curso do despacho aduaneiro e geram diferenças tributárias, como por exemplo uma desconsideração de ex-tarifário.
Apesar de preocupante, a extensão da decisão deve ser avaliada com temperamentos, para resguardar da maneira mais apropriada os direitos e interesses dos importadores.
O escritório GILLI BASILE ADVOGADOS permanece à disposição de seus cliente, parceiros e demais interessados para auxiliar na análise da aplicação da tese de repercussão geral às importações.
Por Alícia Bremer e Jaqueline Weiss